Investimento público em infraestrutura que promova inclusão

O investimento público em infraestrutura pode ser considerado um “motor do crescimento”. O que nem sempre se explicita é o tipo de crescimento a que este motor serve. É que o destino e a forma de execução do investimento público incidem muito forte sobre o desenvolvimento nacional e local. Não surpreende, então, que certos investimentos públicos em infraestrutura possam promover inclusão socioeconômica e outros, não.

Investimento público em infraestrutura que promova inclusão [[Artigo inspirado no Painel Investir melhor para crescer mais, do Foro Metropolitano 2010 organizado em 23 e 24 de novembro de 2010 pela Fundación Metropolitana www.metropolitana.org.ar
]]

O investimento público em infraestrutura pode ser considerado um “motor de crescimento”. É que a construção de infraestrutura viária, energética, de comunicações, de água potável, de irrigação, drenagem, portos, soluções habitacionais, entre outras, facilita o crescimento socioeconômico. O que nem sempre se explicita é o tipo de crescimento a que este motor serve.

Isto acontece porque o destino que se dá ao investimento público em infraestrutura, assim como a forma como ele se realiza, incidem enormemente sobre a natureza que o desenvolvimento nacional e local terão. Não deveria, então, surpreender que certos investimentos públicos em infraestrutura possam promover inclusão socioeconômica e outros, não.

O destino do investimento público em infraestrutura

A destinação do investimento público em infraestrutura se decide considerando critérios econômicos, tanto setoriais como territoriais. Não obstante, nem sempre se explicita que cada opção de investimento tem também diferentes implicações sociais e políticas e que, de maneira aberta ou encoberta, estas dimensões também pesam forte ao decidir o investimento público. É que cada tipo de destino favorece diferentes atores. Assim, por exemplo, uma obra viária pode favorecer toda uma comunidade ou, segundo seja seu traçado, somente certos produtores ou usuários: muito distinto seria o impacto quanto à inclusão se os beneficiados pelo investimento em infraestrutura viária fossem em sua maioria grandes produtores e vizinhos de renda alta ou, pelo contrário, se também incluíssem um número significativo de pequenos produtores e de famílias de baixa renda.

De igual modo, competem entre si vários possíveis destinos setoriais, cada um com diferente impacto sobre a inclusão socioeconômica. Um investimento público em um determinado setor compete com as necessidades insatisfeitas dos outros setores já que o apoio público está sempre sujeito a uma restrição orçamentária. Se bem os interesses do conjunto social devam guiar o destino do investimento público, o certo é que não exista uma destinação ideal e universal deste investimento, senão que a mesma esteja em função da diversidade de circunstâncias, incluindo a fase de desenvolvimento em que o país se encontre, os objetivos que persiga e a prioridade destinada aos esforços de inclusão, a correlação de forças políticas que predomine, a concepção acerca de como gerir o desenvolvimento, a disponibilidade de recursos e as múltiplas demandas que convergem sobre o orçamento do governo nacional e dos governos locais.

Com respeito à destinação territorial do investimento público em infraestrutura, acontece algo parecido. Ainda se os efeitos benéficos de qualquer investimento em infraestrutura pudessem se irradiar para além do território no qual se executa, seu impacto favorece diferentemente a determinadas economias regionais, dentro das quais talvez a alguns atores mais que a outros e, em consequência, a diferentes governos e políticos locais.

Além dos exemplos oferecidos, fica assinalado que o destino que se determine ao investimento público em infraestrutura incidirá em maior ou menor grau sobre o processo de inclusão econômica de diferentes segmentos da população nacional e local.

A forma de materializar o investimento público em infraestrutura

Não obstante, a capacidade do investimento público em infraestrutura para promover inclusão socioeconômica não depende somente de sua designação ou destino, mas também da forma como este investimento é materializado. Aqui, somam-se dois aspectos da maior importância: (i) quem, definitivamente, executa o investimento, e (ii) quem se aproveita dos efeitos multiplicadores que derivam dele.

(i) Os executores de investimento público em infraestrutura podem ser grandes empresas, às vezes reunidas em consórcios quando se trata de encarar obras de grande envergadura. Estas empresas recebem os contratos de obra e, ao cumpri-los, geram empregos e obtêm benefícios que lhes permite seguir crescendo. Parece que não há muito mais que agregar a este respeito e, não obstante, não é assim. Quem encomenda a obra pública, seja o governo nacional ou os governos locais, pode incidir para que o impacto sobre a inclusão socioeconômica do investimento público em infraestrutura seja maior ou menor: dependerá do tipo de obra, de como se apresente o investimento e dos critérios de seleção que se estabeleçam e nos chamados à licitação. Assim, por exemplo, haverá algumas obras de infraestrutura que poderão se realizar divididas em partes de modo que pequenas e médias empresas possam entrar no concurso para conseguir os contratos. É o caso de programas de soluções habitacionais que, se não divididos em partes, somente poderiam ser encarados por grandes empresas construtoras; ao contrário, se estes programas pudessem ser estruturados em conjuntos de 50, 100 ou 200 soluções habitacionais, seria facilitada uma mais ampla participação empreendedora.

(ii) Todo investimento público em infraestrutura gera efeitos multiplicadores, alguns mais diretos, como os empregos ou rendas derivados de obras realizadas, e outros potenciais associados às novas condições que o próprio investimento público cria. Com respeito a este último, quem encomenda a obra pública pode adotar uma atitude de prescindir de intervir de modo que essa nova potencialidade seja percebida e aproveita pelo mercado, isto é, por aqueles setores que tivessem melhor visão, maior acesso à informação pertinente ou simplesmente dispusessem dos recursos e da organização que fosse requerida. Não obstante, esta atitude de prescindir de intervir traz um duplo risco: por um lado, que ninguém em nível local aproveite as novas oportunidades, com o que se esterilizaria uma boa parte dos efeitos multiplicadores na localidade do investimento público em infraestrutura; por outro lado, como os que hoje se encontram em melhores condições para aproveitar das novas oportunidades não são os setores atrasados e menos ainda os excluídos da atividade produtiva formal, a ausência de uma intenção compensatória reforçaria a tendência à concentração.

Em troca, muito distinto seria o impacto se os que encomendam o investimento público em infraestrutura incluíssem de forma explícita dentro do desenho da obra e das licitações o objetivo de ajudar com a obra pública as políticas de inclusão. Neste caso, o setor público necessitará adotar uma atitude mais ativa, qualificando suas equipes técnicas para que saibam incluir em cada licitação modalidades operacionais que facilitem que pequenas e médias empresas possam aproveitar as oportunidades derivadas dos efeitos multiplicadores da obra pública. Uma coisa é destacar em termos gerais que estes efeitos multiplicadores poderão se dar, e outra muito distinta seria não só identificar as oportunidades que se estima emergirão com o investimento público, mas também sugerir como os pequenos produtores poderiam dele aproveitar. Neste sentido, os que destinam o investimento público em infraestrutura poderiam contar, como parte do esforço de programação do investimento, com uma unidade especializada para atuar como um tipo de desenvolvedora de empreendimentos inclusivos [[Para uma breve descrição do conceito de [desenvolvedora de empreendimentos inclusivos,->http://opinionsur.org.ar/Desenvolvedoras-de-empreendimentos?lang=pt]]]. Essa unidade analisaria os possíveis efeitos multiplicadores de cada investimento público e, em função disso, desenvolveria opções para que pequenos produtores hoje dispersos pudessem aproveitar as novas oportunidades articulando-se em organizações econômicas de médio porte por meio da utilização da moderna engenharia de negócios.

Catalisar, e não travar

Esta dimensão do investimento público em infraestrutura como promotor da inclusão socioeconômica deve ser bem trabalhada para que efetivamente catalise a participação de pequenos e médios empreendimentos sem travar ou demorar a execução mesma da obra pública. Pouco favor faríamos aos esforços de inclusão se terminássemos convertendo-os em novos obstáculos para um desenvolvimento nacional e local que necessita com urgência de investimento público em infraestrutura.

Toda inovação requer determinação para encarar as dificuldades e os riscos que as mudanças acarretam, bem como criatividade para desenvolver efetivas soluções. Isto é possível e desejável apesar do duplo desafio que significa, por um lado, enfrentar as resistências dos que veem seus privilégios afetados e, por outro, superar nossa própria ignorância, inércia, negligência ou inépcia. Há muito o que pensar, para criar, experimentar e propor neste campo.

O setor público, as organizações da sociedade civil, a comunidade científica e tecnológica e o mais inovador do setor privado podem convergir para sustentar esta inovação com conhecimento de excelência, em lugar daquele residual ou de descarte que consiga se dedicar aos setores mais postergados de nossas sociedades. Trata-se, nada mais, nada menos, de melhorar a efetividade socioeconômica do investimento público em infraestrutura.

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