Transformar através da catalisação do microcrédito

Não é possível assegurar a viabilidade de um micro ou pequeno produtor só possibilitando seu acesso ao crédito. Trata-se de uma condição necessária, mas não suficiente. Como completar o esforço realizado por aqueles que fornecem microcréditos e outros serviços microfinaceiros? Quais os aspectos a serem considerados? Por onde começar? Uma iniciativa que vai ao encontro dessas questões essenciais.
O microcrédito e as microfinanças são elementos essenciais em qualquer estratégia séria destinada a abater a desigualdade e a pobreza. Não deveria haver dúvidas sobre a validez desses instrumentos, mesmo que eles, como tudo nesta vida, ainda possam ser melhorados e que, ocasionalmente, haja programas mal concebidos ou pobremente gerenciados que acabem por fracassar. Através do crédito e de outros serviços financeiros, as microfinanças irrigam os segmentos da população que constituem a base da pirâmide social. Elas podem contribuir muito, e de fato o fazem. Porém, também vale reconhecer quais são as coisas que não podem conseguir por si sós e quais as limitações nas que seria bom trabalhar para potencializar esses esforços.

O essencial é reconhecer que geralmente não é possível assegurar a viabilidade de um micro ou pequeno produtor só possibilitando seu acesso ao crédito e a outros serviços financeiros. Tal como analisamos em edições anteriores da Opinión Sur, esse elemento é tão importante que o consideramos uma condição necessária para a viabilidade da micro e pequena produção; no entanto, ele não constitui uma condição suficiente. Também é preciso que os microprodutores disponham de vários outros fatores, tais como o acesso a conhecimento de excelência, informação comercial, contatos, moderna engenharia de negócios e uma melhor articulação com outros agentes econômicos no interior de promissoras aglomerações produtivas. Além disso, é fundamental alinhar a política macroeconômica aos interesses da base da pirâmide social (gasto público, política fiscal, política monetária).

A Opinión Sur desenvolve pensamento estratégico e conteúdos específicos dirigidos às políticas públicas e às iniciativas privadas voltadas para a redução da desigualdade e da pobreza num contexto de desenvolvimento sustentável. Nesse caminho, temos acumulado certa experiência quanto a como completar e catalisar os programas de apoio à base da pirâmide social, aos micro e pequenos produtores, às comunidades atrasadas, e aos excluídos, incluindo as ações desenvolvidas pelas entidades de microcrédito e microfinanças. Estamos convencidos de sua valia e de que seu impacto poderia crescer significativamente se acrescentássemos a essa mistura alguns elementos catalisadores. É por isso que desenhamos umas Jornadas de Trabalho orientadas a fortalecer os programas de microcrédito através de novas iniciativas e instrumentos que atuem como complemento deles.

Vejamos, a seguir, como seria uma jornada-padrão:

Jornada de trabalho: Microcrédito Século XXI

Intervenções catalisadoras para ampliar o impacto dos programas de microcrédito

O microcrédito e as microfinanças canalizam recursos financeiros e conhecimento para milhões de famílias pobres no mundo. Tem se conseguido avanços em várias frentes, mas ainda há muito a ser feito. Enquanto isso, a globalização e o próprio desenvolvimento local criam novas misturas de problemas e oportunidades. Surgem diversas opções e caminhos para o microcrédito do século XXI. Quais escolher? Que rumo seguir?

Esta Jornada de Trabalho sobre Microcrédito no século XXI propõe (i) entender acabadamente o contexto no qual a viabilidade do microprodutor é posta em jogo, (ii) avaliar o tipo de ação abrangente que tem de ser encarada, (iii) reconhecer a função do microcrédito e das outras ações complementares necessárias para assegurar a viabilidade dos pequenos produtores, (iv) desenhar métodos que permitam estabelecer sinergias com outras entidades sem comprometer o foco e a especialização que cada uma delas tem de preservar, e (v) explorar novas formas de melhorar a articulação entre os micro e pequenos produtores e as aglomerações produtivas promissoras, e implementar ações específicas que permitam materializá-las.

A Jornada de Trabalho é voltada para pessoas do setor público, do setor privado e da sociedad civil: (i) indivíduos que dirijam programas de microcrédito e outros programas focados na base da pirâmide social; (ii) empresários interessados em desenvolver sua responsabilidade mesoeconômica; (iii) jornalistas e meios de comunicação; (iv) professores e estudantes avançados de universidades e escolas técnicas; (v) funcionários municipais, ONGs e público em geral que estejam interessados neste tema.

Primeiro módulo: O microcrédito como condição necessária, mas não suficiente

Os problemas de pobreza e subdesenvolvimento têm sua origem em processos complexos; não existe uma única causa que os explique nem uma solução simples para sua superação. Para encarar um desafio dessa natureza e envergadura é preciso considerar uma diversidade de ações complementares, sem ignorar o que já foi feito. O que será preciso acrescentar à prática atual do microcrédito?

_ – Os micro e pequenos produtores fazem parte, mais bem ou mais mal posicionados, de arranjos produtivos integrados ao sistema econômico local.
_ – Formas em que essa articulação com os outros agentes econômicos se manifesta.
_ – Condições de troca prevalecentes.
_ – Resultados positivos (formação de capital e melhora do consumo) ou negativos (eles se mantêm no nível de subsistência).
_ – Os tempos sociais e políticos da luta contra a pobreza.
_ – Necessidade de completar o microcrédito com outras ações catalisadoras.

Segundo módulo: Construindo novos caminhos para o microcrédito

Como criar, então, um ambiente favorável para os micro e pequenos produtores, e melhorar a articulação deles com o sistema econômico do qual fazem parte? Quais os fatores que condicionam o sucesso ou o fracasso desse propósito?

_ – Acesso aos conhecimentos necessários para eles se desenvolverem no mundo contemporâneo.
_ – Que disponham de informações sobre boas oportunidades.
_ – Que contem com a capacidade necessária para poderem aproveitá-las.
_ – Que possam operar num ambiente econômico e social favorável.
_ – Sistemas de apoio apropriados.

Na atualidade, as economias são cada vez mais dependentes do conhecimento. Não é possível ter acesso às oportunidades sem o conhecimento necessário para encará-las. Com o decurso do tempo, a lacuna de conhecimento existente entre os diferentes países e no interior de cada país se agiganta.

A moderna tecnologia informática e de comunicações pode democratizar o acesso ao conhecimento, mas esse acesso precisa ser fortemente impulsionado e promovido para que possa se materializar.

Se dispor de informações sobre oportunidades econômicas constitui um primeiro passo, mas poder aproveitar essas oportunidades é uma questão mais complexa.

Terceiro módulo: Apoio abrangente à base da pirâmide socioeconômica

A luta contra a pobreza não pode limitar-se à implantação de um “plano” específico destinado a abatê-la; também é necessário o envolvimento e a contribuição das políticas públicas e das iniciativas do setor privado e da sociedade civil.

_ – Políticas macroeconômicas que mobilizem a base da pirâmide socioeconômica: política de gasto público, política fiscal e política monetária.
_ – Responsabilidade mesoeconômica das empresas que lideram arranjos produtivos; programas de pequenos fornecedores e distribuidores.
_ – Melhoria nas relações de troca das pequenas empresas: incorporação de conhecimentos, aumento da produtividade e formação de capital, melhores preços e assistência tecnológica, articulação com empresas locomotoras de médio porte.
_ – A função de apoio e acompanhamento desempenhada pelas organizações de desenvolvimento que fazem parte da sociedade civil.

O tema das relações de troca é complexo, porque nele convergem condições de concorrência entre redes econômicas e outras ligadas à vontade dos agentes. Se as melhorias nas relações de troca com os micro e pequenos produtores desconjuntassem as empresas que as facilitam quanto a preços, qualidade ou prazos, então seria difícil materializá-las. Porém, na maior parte das vezes, essas melhorias não afetam a viabilidade das cadeias de valor, pois quando elas são bem trabalhadas redundam no aumento da produtividade dos pequenos produtores e na expansão do mercado interno, fatos que acabam por gerar melhores resultados para todos. Trata-se dum campo relativamente pouco explorado da mesoeconomia.

Quarto módulo: Novas instituições para apoiar a mudança de rumo

Para facilitar novos caminhos de desenvolvimento aos microprodutores se precisa de um sistema de apoio parecido, mas não igual, com o que existe nos países afluentes. Um sistema que estimule e acompanhe a evolução do esforço empreendedor. Trata-se de dar lugar a instituições de novo cunho que completem o microcrédito recebido pelos pequenos produtores através de iniciativas que os encaminhem para setores promissores e possibilitem seu acesso ao capital e aos mercados.

_ – Desenvolvedoras de empreendimentos produtivos dedicadas a dar apoio à base da pirâmide social.
_ – Redes de investidores anjos social e ambientalmente responsáveis.
_ – Fundos locais de apoio ao investimento produtivo.

Trata-se de uma bateria de instrumentos de promoção locais que se completam entre si: eles estão desenhados para operar nos mercados contemporâneos, mas com o mandato explícito de dar apoio àqueles empreendimentos que, em definitiva, prestem ajuda à base da pirâmide socioeconômica.

Eis a descrição da Jornada. Tomara que estas idéias e propostas sejam de utilidade para aqueles que promovem um desenvolvimento mais sustentável nos países do Hemisfério Sul. Para obter mais informações: [email protected]

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